quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Você é muito especial

Eu segui você esse ano. O ano todo, praticamente. Acompanhei as músicas que você ouviu, os filmes, o que você comeu no almoço, o baixo astral, o alto astral, as festas. Vi que seu cachorro velhinho morreu de câncer. É muito comum os cães morrerem de câncer, ouvi dizer que...
Acho que vi e compartilhei todos os vídeos, gosto dos seus vídeos. E suas fotos? São incríveis, lembro muito bem de uma. Acabei compartilhando algumas fotos também, não sei se percebeu.
Eu segui você, acho que foi esse ano que comecei né? Nem sei mais, porque aconteceu tanta coisa esse ano que nem sei... passou rápido. Aconteceu tanta coisa com a gente. Não sei se você soube, mas eu também pedi demissão e aí já viu, recomeçar... Na verdade nem foi assim tão traumático, pensando agora. Nem sei.
Parece que esse ano fiquei correndo atrás de várias coisas e perdi a noção do todo.
Na hora parece tudo difícil e no fim do ano parece que não aconteceu nada.
Faz uns dias que você não fala nada, viajou? Vi umas fotos que pareceu que sim. Acho bacana esse seu jeito cool, nunca se sabe o que tá mesmo acontecendo e.
Bom, na verdade nem era isso que eu ia dizer. Nem era. Ia te dar feliz natal?
Desculpa mandar um e-mail assim comprido de surpresa, eu sei que você nem gosta, mas.
Você é muito especial,
Beijo e feliz ano tamb

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Fazendo tempo

Faz tempo que eu não leio algo sem pressa e sem pensar se é bom ou não. Faz tempo que eu não leio um texto legalzinho até o fim e sem pressa. Faz tempo que eu não tenho tempo de ser conquistada por umas palavras. Faz muito tempo que não leio um livro sem necessidade nenhuma. Faz tempo que eu não escrevo sem pressa e sem pensar se é bom ou não.
Faz tempo que a eficiência ocupou um espaço enorme da minha vida.
Merda.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

atuar pra poder voar

- é difícil, viu meu bem? quem falou esse negócio de "atuar pra poder voar", tava falando do quê? quem atua voa, por acaso? atuar é aquela coisa existencialista, que não quer ser porque é social. só que também não é social porque não consegue chegar. ah, a sociedade é tão grande que não cabe no meu talento. sabe? nunca voei, não consigo. esse negócio de voar é pra quem pode, pra quem tem um ego ou um gênio muito grande. tenho vergonha até. e a vergonha que me dá é de tudo, de atuar, de não atuar, de trabalhar, de querer receber pra fazer teatro (que aí nem chamo de trabalho). é uma vergonha que não vejo em quem voa, por exemplo. os voadores acreditam que têm talento suficiente. aí fico achando que tenho que dar aula, que tenho que fazer teatro de esclarecimento. como se fosse possível clarear alguma coisa. pronto, bate a vergonha de achar que atuar serve pra alguma coisa. mas também não dá pra fazer qualquer coisa, né? o artista tem obrigação de tapar buracos na educação e na cultura. nossa, é difícil viu? no fim, a arte ainda serve pra alguma coisa, num serve?
- eu adoro musicais.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

de olhos bem abertos

ao amor da minha vida um beijo, na boca
aos amores passados da minha vida os mesmos beijos, nas bocas
mãos dadas, dedos enlaçados e grudentos desde o primeiro amor
desde o primeiro o aprendizado do beijo, beijar é assim
lábios se encostam, se abrem, se roçam e sugam as línguas
braços na cintura, no pescoço, nas partes
mãos
bocas
orelhas
pênis
bunda

olho nos seus olhos meu amor, olho suas marcas na testa, um pêlo que sai do nariz
seguro sua orelha entre os dedos e penso
nunca nos envergonhamos de nossas carícias treinadas
nunca procuramos um gesto nosso
nossas boquinhas ensinadas
os dedinhos
nunca estranhamos
e agora?

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Aprender a desaprender

Quando eu era pequena achava, sinceramente, que eu era digna de sucesso. Não, não é isso. Quando eu era pequena, eu achava que podia fazer qualquer coisa. Ainda não é isso. Quando eu era pequena fazia tudo que eu imaginava.
Eu escrevi, atuei e dirigi uma peça na 3ª série. Também coreografei e dancei duas músicas da xuxa, com paquitas, na escola. Na mesma época criei um jornalzinho da escola, com vários colaboradores. Pouco depois criei um mural-correio na escola. Por volta dos 10 anos organizei um desfile caipira (era um evento inédito) para a festa junina da escola. Eu era um prodígio, pelo menos a diretora da escola acreditava nisso.
Algumas tentativas de assédio sexual, assédio moral, espancamento e difamação contra mim também ocorreram na mesma época.
Depois desse período, fui ficando cada vez mais reservada. E veio a adolescência. Minhas vontades começaram a me parecer cada dia mais idiotas. Ser invisível me pareceu mais agradável e mais seguro.
A medida que fui ficando mais invisível, minha vida foi se tornando mais fácil. E assim passei a adolescência toda tentando sumir, tentando ser mais uma. Consegui, ou quase.
Hoje eu penso em quanta violência eu sofri na infância, imagino que outras crianças também tenham sofrido. Penso no quanto essa violência foi importante para destruir uma insipiente criatividade, razoavelmente independente.
É assim que se educa crianças ainda?
Aos 30, fico aqui tentando driblar uma derrota prevista, uma frustração antecipada. Quase sempre na base da invisibilidade temporária. Aprendi direitinho.
Falta agora desaprender tudo que a escola me ensinou.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

uma afronta e três pessoas que responderam

os alto-falantes disseram aos usuários que não colocassem os pés sobre os assentos, os assentos devem ser respeitados.

um usuário observou - parece brincadeira isso, nem tem lugar pra sentar imagina pra por o pé.

uma usuária observou - não é brincadeira não, é uma ofensa isso.

uma outra - parece piada mesmo.

o mesmo usuário - pior que em todo trem falam a mesma coisa, e a gente nem consegue entrar no trem muitas vezes. por o pé, vê só! eles tiram uma com a cara da gente.
ó aqui no jornal, vão fazer o trem até guarulhos, precisa mesmo.

uma usuária disse - vão fazer por causa da copa né?

o usuário - mas vai ser bom. isso se fizerem mesmo.

a usuária - também falaram em ampliar a rede de metrô e trem, anos depois e nada. mas aposto que o trem até guarulhos sai.

o usuário - é, eles mentem muito. eu votei nesse aqui, no alkmin. mas não sei não... não sei se é de confiança.

a usuária pensou e calou - ele votou...

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Mais uma história de heróis

33 mineiros foram resgatados de uma mina de ouro e cobre no Chile após 70 dias de soterramento. O resgate aconteceu antes do tempo inicialmente previsto, que era de 3 a 4 meses. Os mineiros foram recebidos pelos familiares e pelo presidente, que aguardavam ansiosos desde o acidente. Os mineiros se tornaram pop stars, ou heróis, como também têm sido chamados. O mundo inteiro se comoveu com a história desse resgate dramático. O presidente chileno, um empresário mineiro, já tem algumas palestras agendadas pelo mundo afora, o tema: segurança nas minas.

33 homens trabalhavam a mais de 700 m de profundidade. O ambiente é úmido e quente (temperaturas acima de 40°). Houve um acidente, a saída da mina foi bloqueada e os homens enterrados lá dentro. De acordo com as leis chilenas, toda mina deve ter pelo menos duas saídas, a lei não foi cumprida nesse caso.

33 trabalhadores ficaram soterrados por 70 dias a mais de 700 metros de profundidade. 33 trabalhadores de uma mina de ouro e cobre foram soterrados e foram resgatados 70 dias depois.

Homens escavam o terra em busca de ouro e cobre, esses homens trabalham para empresas. Homens morrem no fundo da terra, no Chile e na China. Onde mais? Homens vivem enterrados.

Enterraram os homens a centenas de metros de profundidade, deixaram que ficassem lá por 70 dias, depois desenterraram e sugeriram que devemos festejar.

33 homens presos debaixo da terra. Quantos mortos?

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

morri

não sei mais o que escrever aqui
não vem nada
não quero mais inventar assunto
pro blog não morrer
pra que serve um blog?
alguém me ajuda

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Fórum não

Antes que isso aqui se transforme em fórum sobre transporte público, faço minha última reclamação. Mesmo sabendo que terei muitas razões pra reclamar nos próximos 4 anos.
Hoje levei duas horas para vir de trem da barra funda pra vila olímpia. Não, não foi no horário de pica, foi entre 13hs e 15 hs. Porquê?
40 min de espera na plataforma barra funda, devido a avarias. Paradas longas e velocidade reduzida na linha grajaú. Na estação cidade universitária ficamos 10 min parados e tivemos que descer do trem. Explicações: problemas na composição. Em duas, porque a que vinha atrás também despejou os passageiros na estação cidade universitária e se foi.
Dá pra acreditar que foram problemas isolados? Nas duas linhas, no mesmo período?

Gente! Nós ficamos enlatados hoje.
Na saída do trem dei meu recadinho: Isso aí, continuem votando no alkmin. E ainda tive que explicar pra um usuário ingênuo que as pessoas não são mal-educadas, elas foram desrespeitadas e esmagadas. Pior: elas pagaram para isso e não receberam nenhuma explicação.
Obs: eu não estava passeando durante a tarde, estava a caminho do trabalho, assim como a maioria dos trouxas.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Curiosidades via Google analytics

A palavra-chave que traz mais usuários para o blog, via google, continua sendo santa periquita. Felizmente, meu nome, o nome do blog e expressões parecidas ultrapassam a periquita (nem sempre foi assim).
O número de visitas não varia muito e cai nos finais de semana. Esse dado me leva a crer que os leitores são amigos que fogem do trabalho no blog.
O tempo médio de permanência é 2 min, o que acho incrível.
Bom, tem muitos números e eles não variam muito, mesmo porque não faço nada para melhorar a performance do broguinho. Se ainda utilizo o GA é por pura curiosidade.
E às vezes aparecem uns dados realmente curiosos. Por exemplo: há um tempo atrás a região nordeste era representativa, ficando atrás apenas da região sudeste na frequência ao blog. Agora o interesse se deslocou para a região centro-oeste, sul e cidades do interior de minas que antes não apareciam. Porque?
Ah, esse mistério o google não resolve... nem o mistério do interesse pela santa periquita.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O poço

Era fundo, tão fundo que não se via o quanto. Quando se olhava da beira para dentro era um ímpeto. Era vazio e frio, mas no fundo não dava pra saber o que era. O fundo parecia quente.
Jogou um dia uma moeda - quero conhecer o fundo.
Nada. O buraco continuava gelado.
Então, jogou no poço um espelho. Era tão fundo que não viu quando o espelho chegou ao fundo. Silêncio.
Seguiu chorando. Aquele escuro era uma ausência insuportável.
Imune àquela escuridão, ou, por outro lado, interessada justamente por ela resolveu que ia conhecer o fundo de qualquer jeito.
Olhava sempre pra ele e procurava um brilho qualquer.
Talvez de tanto olhar, um dia viu uma luz lá embaixo. De cima era frio e escuro como sempre, mas viu um brilho e teve certeza que no fundo era quente.
Ficou olhando hipnotizada para a luzinha trêmula. Lembrou que tinha jogado um espelho lá, a luz devia ser o reflexo. Mesmo assim, via a luz como um sinal.
Falou com ele pela primeira vez. Falava baixo porque sabia que ele podia entendê-la.
Não pedia nada, não jogou nenhuma moeda, nada. Só falava e sentia que no fundo ele entendia.
Ela ouvia o eco da própria voz e tentava se conter. Ele ouvia.
O seu silêncio reverberava, o escuro era frio e o fundo era quente. Era o que ele dizia - silêncio, escuro e fundo. Ela entendia, como entendia!
E voltou muitas vezes, horas e dias sentindo o bafo frio que vinha dele e o silêncio. Ele era profundo demais.
Ela suspirava e até chorava quando pensava no seu profundo silêncio. Comovia-se com o silêncio e a escuridão que eram essenciais nele. Amava, enfim.
De repente decidiu que era o momento de descobrir o que escondia a escuridão e o silêncio. A luzinha continuava lá, dias mais forte, dias mais fraca, às vezes quase nada. Mas a luz continuava lá, era o sinal? Quando se olhava da beira para dentro era um ímpeto.
Mergulhou no frio escuro, olhou pra baixo e mais uma vez teve certeza que no fundo era quentinho.
Caiu por muito tempo, lá dentro era frio e escuro como parecia e não via nada.
Chorava porque tinha certeza que no fundo era quente, sentia o hálito e tinha certeza.
Quando finalmente chegou ao fundo estava quentinho. Chorava, mergulhava com gosto e não queria mais nada.
Encontrou no fundo sua moeda e o espelho, eles ainda estavam lá. Nadou durante horas, nunca tinha sido tão feliz.
Estava tão alegre que não percebeu que ficou gelado, quando percebeu já estava.
Tremia, os dentes batiam uns contra os outros.
Não entendia, falou. Nenhuma resposta, a profundidade de sempre.
Ela falou em quanto tempo tinha caído poço adentro e no quanto tinha chorado de alegria.
Ele permaneceu em silêncio.
Só aí ela entendeu que as suas lágrimas é que eram quentes.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Amor

7 anos não é pra qualquer um. Pra contrariar as expectativas, fechando o sétimo ano sem crise. O único dos 7 sem crise? Somos do contra mesmo.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Mais uma blusa no metrô?

Hoje, quando cheguei na estação República, ouvi um aviso que advertia sobre lentidão na linha. Um funcionário do metrô me disse que no sentido Barra Funda eu podia embarcar tranquila, já no outro sentido...
A plataforma tava cheia quando embarquei. O trem começou a cheirar queimado assim que entrei. As pessoas começaram a se olhar (e isso é muito difícil de acontecer) e comentar sobre as ocorrências que já tinham passado hoje. Ficamos com medo porque o cheiro de queimado só aumentava.
Na estação Marechal pediram a todos que desembarcassem e o trem foi embora vazio. Trocamos de trem. Fiquei em dúvida se o problema de hoje também foi uma blusa, afinal, é algo comum blusas se prenderem nas portas do metrô. Assim como bolsas, pessoas, mochilas, etc...
Mais uma vez encontrei notícias sobre o ocorrido, que apresentam apenas a versão oficial do metrô. Ninguém falou sobre o problema real do trem. Porque estava com cheiro de queimado? Era o único trem com problemas hoje, ou era um problema da linha? Não sei.
Será que a Soninha sabe? Sabotagem?


portal terra

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Metrô ou monte de cocô

Se o uol apresentou uma listinha com os problemas relatados pelo metrô com 12 ocorrências nos últimos 2 meses, imaginem quantas ocorrências reais aconteceram.
Quem usa o metrô sabe que todo dia é dia de transtorno, não, ele não funciona bem. Não comporta a quantidade de passageiros, não é eficiente, nem humanamente aceitável.
Hoje, quando cheguei na estação república (às 9h45), tinha uma folha escrita à mão avisando que havia um problema na sé e, por isso, a estação estava fechada. Os alto-falantes informavam que os trens estavam parados devido a presença de usuários na linha. Logo imaginei que era um suicídio coletivo.
Interessante observar que a culpa pelo péssimo funcionamento dessa bagaça sempre sobra pro usuário (que paga R$ 2,65 por passagem). Segundo o atual governador, o tal de Goldman, o problema de hoje foi causado por uma blusa presa à porta. É mesmo? Que trenzinho frágil, né?
Outro ponto interessante é que a demora em normalizar o funcionamento do metrô deveu-se mais uma vez à imprudência dos usuários, que saíram dos trens e caminharam pelas vias. Quem quiser ver com os próprios olhos pode procurar no youtube. Achei também um vídeo (trecho de reportagem) no portal R7.
- Gente pobre, porque vocês não quiseram ficar enlatados dentro dos trens? Porque tanta revolta, tanta impaciência? O metrô é feito por cada um de nós (é só conferir nos cartazes), são as nossas atitudes que podem fazer do metrô um lugar melhor.
Como discordar do marketing do metrô? Somos nós que fazemos essa merda mesmo, ou melhor, nós pagamos essa merda. Ou melhor, nós quebramos essa merda. Não dá pra ficar impassível todo dia.
Há esperança? Claro, Alckmiiiim vem aí, lá, lá, lá, lá, lá, lá. Vamos ampliar as marginais e comprar carros, esse projeto tá funcionando. Num tá? Os pobres podem, quem sabe, conseguir um financiamento? Ninguém abandona o carro pra reclamar do trânsito, esse povo pode se civilizar.
Pior que todo esse acontecimento é a forma como ele é tratado pela imprensa. Uma notinha dá conta de pontuar o que houve, se não houvesse internet talvez ninguém nem soubesse (ninguém que não anda de metrô).
Vomito agora ou mais tarde?
Amanhã, no metrô.

A merda, na merda do uol.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Um olho é um olho

Ele me olhava nos olhos com insistência. Sabe quando a pessoa não consegue parar de te olhar?
Eu estava comendo ainda, enquanto ele já tinha terminado e me olhava com uma cara de quem se divertia.
Nuvens, quando tudo é legal e você se sente. Ele se divertia e isso era bom.
Arregalei os olhos, fazendo uma careta pra ele saber que estava curtindo. Ele riu de leve.
Ficamos conversando em frente aos pratos sujos, íntimos. Zonza. Alegre. Leve.
- Preciso ir ao banheiro.
Quando me olhei no espelho, o delineador estava borrado. Um olho mais caído que o outro. Ridícula.
Comicidade não parecia uma qualidade naquele momento. Limpei o olho, tentei deixar os dois iguais de novo.
Agora eu não tinha mais certeza de que a noite estava boa. O riso. Merda.
Como podia mudar tudo tão rápido? Menos de 5 minutos antes ele parecia apaixonado. Agora ela era a ridícula.
Voltei pra mesa onde agora tinha um copo de cerveja me esperando. Ele sorriu.
Ufa!
Acabamos trepando loucamente, como dizem.
Depois de um tempo esqueci o olho, o delineador, o cheiro de comida enquanto ele ria. Esqueci tudo, inclusive ele.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

O banheiro

A funcionária se levantou de sua mesa e foi ao banheiro pela primeira vez no dia. A sua supervisora anotou: Saída às 16:28/ Volta às 16:34.
A funcionária se levantou de sua mesa e se dirigiu ao banheiro pela segunda vez no dia. A sua supervisora anotou: Saída às 17:58... - Porque você não usa esse banheiro aqui? É mais próximo. A funcionária justificou - É que aproveito para beber água quando vou ao banheiro. Volta às 18:05.
Às 18:34 a supervisora chamou a funcionária até a sua mesa. - E se você deixar uma garrafa de água no frigobar? Fica mais perto pra você. A funcionária disse que aproveitava a ida ao banheiro para pegar um café, ou uma bolachinha pra enganar a fome.
Às 19:37 a supervisora trouxe uma bandeja com alimentos: frutas, bolachas e chocolates. E bebidas: água com gás e sem gás, suco e refrigerante diet. Trouxe o frigobar para mais perto e abasteceu-o com os alimentos e bebidas - Olha, vou deixar o frigobar cheio e bem pertinho de você. Não é bom?
A funcionária gostou - Puxa! Não tinha pensado nisso, ótima idéia. E o penico?

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Breve esclarecimento

Às vezes penso que deveria ser mais clara. Escrevo confusamente, atropeladamente e sem vírgulas. Ou confusamente, atropeladamente, cheia de vírgulas e dois pontos.
Sim, sei onde colocar a maioria dos sinais. Os sujeitos, as ações, os complementos... sei.
A fala que vem louca às vezes me obriga a ignorar todas as regras. As gramaticais, principalmente. A escrita vem qual fala, louca. Às vezes penso que deveria escrever mais claramente.
As idéias vêm qual fala, ímpeto e improviso. Tenho pena de matar o seu fluxo natural. Não tenho coragem de amputá-las de seus ritmos, que são parte de suas vidas.
As idéias nunca são puras e limpas, pelo menos as minhas. Principalmente quando se fala da chamada realidade. Como organizá-la em orações? Como organizá-la sem colaborar para uma maior desapropriação da realidade? Como organizar sem mentir?
As idéias, as palavras, a escrita se apresentam assim e eu as reapresento assim, às vezes assado. Sempre que possível assim mesmo.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Tumbeiro

O navio parte da estação corinthians-itaquera lotado. A essa altura atulha os que cabem, que vieram de outras estações. O alto falante diz que fiquem à direita, que fiquem à esquerda, que permaneçam nos corredores, que respeitem os assentos. Eles não entendem essa língua, permanecem mudos. Seguem mudos até o destino, onde são despejados para limpar a sujeira dos outros, fazer a comida dos outros, construir a casa dos outros, ganhar o dinheiro dos outros. Continuam sem entender a língua, porém entendem o que devem fazer.
Os seus donos têm o direito de usufruir de suas vidas por no mínimo oito horas diárias, uma vida inteira. Hoje vivem muito mais que antes e podem ser dispensados de sua função a qualquer momento. Os proprietários não precisam mais vendê-los, basta colocá-los para fora (nenhuma responsabilidade). Os tumbeiros também mudaram, as viagens que duravam três meses, agora duram a vida toda.
No entanto, os tumbeiros continuam matando, não se sabe exatamente porque. Uns dizem suicídios, os incrédulos dizem assassinatos. Não se sabe se se jogam, se são empurrados, se caem... Não se fala no assunto claramente, não se sabe. Não sabemos se não suportam mais e decidem morrer ou se não têm opção. O alto falante diz: usuário na linha. Não entendem a língua, mas pela recorrência sabem que ao ouvir essa fala seu dia será ainda pior.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

um café

agora que tomava café sentia ele descendo pela garganta, quentinho. Só isso e já se desenhava em sua mente o dentro do corpo. Mais cedo, no almoço, tinha sentido a comida ir da boca para os tubos que precediam o estômago, chegando nele a comida quase caía no lugar vazio, parecia que boiava. Ninguém acreditava que conseguia sentir o trajeto da comida, mas sentia. Não queria ignorar o que acontecia lá dentro, queria sentir a comida mesmo que estivesse enjoada e ouvi-lo. Ouvia e tateava a si por dentro, por fora e entre. Aquele corpo que mostrava seu esforço em engolir, de modo irritante, era ela. Ela mesma sempre demonstrando seus esforços em engolir. Tateava e via seu útero inchado, não usava as mãos ou os olhos, via o de dentro inchado e irritado, talvez cansado. Cutucava as dores nas costas e no pescoço, apertava seus músculos até encontrar saliências e durezas. E aí sim, metia a mão e elas conversavam, a mão e as saliências, horas e horas. As dores de cabeça é que a irritavam, incontroláveis e impossíveis de tocar com as mãos ou pensar. Olhava para si por curiosidade e amor, não por si, mas pela vida que era. E muito dessa vida era fora, quase sempre fora de si. Por isso às vezes ficava quieta e parada, ou quieta e andando e os olhos perdidos nos fundos. Vivia a si mesma, um pouco por dia, quando dava. Às vezes tomando um café

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Arrabalde, as algemas

Será preciso andarmos de mãos dadas? Por onde olho estão os pares de mãozinhas grudadas. Depois que vi as algemas, entende? Sei que não entendeu quando te disse, mas é claro: as algemas, a dor e a felicidade. Sobretudo a felicidade me incomoda. E, todas grudadas, será preciso sempre todas? Todas me incomodam.
Preferia que nossas mãos estivessem soltas, ou fundidas. Se elas estivessem ensanguentadas e esmagadas juntas. Violentas. Fundidas em uma massa vermelha, cúmplice. Só se fosse assim. Ou soltas, esvoaçantes e lúcidas.
Será preciso explicar mais alguma coisa? Me incomoda que ninguém veja as algemas e o sacrifício que elas me custam. Preferia que a dor fosse explícita, vermelha e roxa. Preferia, ainda, que minhas mãos estivessem soltas e extremamente lúcidas. E você, o que pensa? Eu gosto das suas mãos nas minhas me arrastando cidade afora, mas veja: todas estão grudadas. Todos estão de mãos dadas e não vêem, isso me incomoda.
Eu gosto das suas mãos nas minhas, me arrastando cidade afora.
Será preciso andarmos de mãos dadas?
Algemas, por favor.

domingo, 11 de julho de 2010

Final

A final da copa tá emocionante...

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Feriado em Ibitinga

Porque é bom visitar a mamãe e o papai.

terça-feira, 22 de junho de 2010

No contexto do surrealismo

É guerra. Soube que na guerra nada mais importa, nem as pessoas. As estrelas se apagam porque não é mais possível imaginá-las. Quem poderia ainda imaginá-las? As pessoas ocupam-se em matar as pessoas. Mas é uma morte iniciada há tempos, positivamente. Mas é uma morte iniciada. Positivo. Se tudo tem uma causa, é um efeito. O efeito é fácil de deduzir, ainda mais fácil reduzir. Assim tudo se explica, se analisa e se define.
A lógica agora é essa: a guerra é imaginada. Imagine uma guerra contra o real: as estrelas se reacendem. Não vejo mais os corpos dilacerados por fogo, as estrelas se acendem. É uma guerra sonhada que acontece lado a lado com a redução da realidade às causas, é um efeito. A realidade mostra suas caras nas trincheiras e confunde a cabeça dos homens, eles acham que sonham. Sonho ou realidade, isso ou aquilo, queijo ou goiabada? Romeu e julieta, por favor.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

A leitura

Às vezes um problema de escrita se revela ser de leitura.É assustador pensar em quantas pessoas estão habilitadas para entender a língua portuguesa. Quantas pessoas você conhece que são capazes de entender um texto? Não falo de conceitos complicados, não... Interpretação de texto mesmo. Pense bem. Sem levar em consideração os analfabetos funcionais que saem de nossas escolas, pense na sua turma da universidade, nos seus colegas de escritório, seus amigos.
É assustador, mas ao mesmo tempo me pergunto se a escrita já era. A leitura já era? Em tempos de fotomensagem, skype, youtube... Pra que serve uma língua que poucos conhecem a fundo? Pra que serve todo o conhecimento escrito se não há quem possa lê-lo? Será que é assim que se escreve?
Errar na escrita é bastante compreensível, comum, nem é crime! Problema é nem saber que erra, nem saber que acerta, nem entender o que lê, nem saber que a linguagem escrita é um código, nem saber que é uma forma de comunicação que pode ser eficiente.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Da rua: nem tudo é futebol

Ih, quero ver contra a Alemanha. jogando desse jeito. Com a Coréia é fácil. Hi, hi... Sei não, sei não...


Ah, não tem jeito, não. Só se deus descesse “da” Terra. É muito crack, muito crack.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Será



Quem estiver sem nada para fazer, ou passando por lá de carro dê uma olhada.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

A dama fala com o desconhecido

Olá estranho. Me fala um pouco sobre você. Não, não fala. Ou melhor, mente um pouco sobre você. Mas não mente muito porque não quero saber tudo.
Olá estranho. Eu não gostaria de te conhecer, no entanto sei que isso vai acontecer. Você me olha e eu sei. Antes que você minta mais quero te avisar que quando te conhecer melhor vou te esquecer.
Para que você também me esqueça logo vou contar umas coisinhas sobre mim. Eu nunca faço o mesmo caminho de volta para casa. Eu não durmo na mesma cama mais de uma vez. Eu não tomo banho no mesmo rio duas vezes.
Olá estranho. Eu procurava alguém, acho que era você mesmo. Eu sempre te procurei, algumas vezes achei que tinha te encontrado mas você sumiu.
Olá desconhecido. Eu gostaria de dizer algo sobre mim. Tudo que eu sei procuro esquecer, essa é minha maior qualidade. Meu maior defeito é a memória, se quer ficar aqui comigo não faça nada para eu lembrar.
Olá desconhecido. Quero que você venha comigo, não posso ficar muito tempo no mesmo lugar. Para onde você gostaria de ir? Não diga nada, eu posso adivinhar. Vamos para a próxima esquina e lá escolhemos o caminho.
Olá desconhecido. Lembrar é morrer. Eu me lembro de você, já te vi muitas vezes. Adeus.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Hamlet?

Dizer belas palavras tendo um belo rosto é um pleonasmo insuportável. Entende?

Foi



O acontecimento já foi, mas a imagem ficou.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Indo

Pensava agora que devia ir embora. Estava se preparando para ir há algum tempo, ainda que não imaginasse possível. Sentia a necessidade de sair, ir para um novo lugar.
Um dia pensou que devia ir para um lugar definitivo e foi. Pensava agora que não tinha lugar definitivo, que a vida era um eterno ir com pausas. Era hora de ir.
Estava cansada de medíocres work in progress sempre em progresso, em processo, em lugar nenhum. Oportunidades não remuneradas de trabalho gratuito. Que lugar é esse?
Pensava em como seria fácil ir desta vez, não tinha mais as coisas. As coisas já tinham ficado em diversos lugares e não eram mais suas, o que era um alívio. O mais importante era que não acreditava mais nas coisas.
Pensava agora: este lugar é o lugar das coisas e sem as coisas nada pode fazer sentido, apenas ir.
E foi.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Nada, Glauco.

O assassino do Glauco foi preso hoje, parece que tentava fugir pelo Paraguai num carro que havia sido roubado num cruzamento no Morumbi.
Ainda não se sabe ao certo qual a motivação do crime. O assassino disse que não sabia se estava louco ou se tinha sido uma ordem divina (vi isso no Jornal Nacional). A hipótese mais provável, segundo a opinião do próprio criminoso, seria uma espécie de loucura. É claro que a loucura foi temporária, uma vez que logo ele entendeu que precisava fugir do país para não ser preso. Será que a defesa alegará insanidade?
Uma outra saída, com grande possibilidade de sucesso, seria converter o rapaz a uma dessas igrejas fundamentalistas. Aí sim, a história da intervenção divina ia colar. A defesa poderia fazer uma bela campanha desqualificando o morto, que (segundo a Globo) era “fundador de uma igreja” de daime. Nesta versão, o assassino seria uma espécie de exterminador contratado por deus. Sem dúvida ele teria bastante apoio popular com esta versão.
De uma forma ou de outras, me parece impossível explicar o acontecimento. Se fosse um assalto, um sequestro, um estuprador ou um serial killer em ação eu entenderia. Mas e quando não tem uma categoria tão clara para o caso? Quando se trata de um rapaz, acompanhado de um amigo, que simplesmente matou um cara e seu filho. O que dizer? O que pensar? Como encontrar uma lógica que torne o fato entendível, pelo menos?
Se eu pudesse arriscar levianamente a motivação do criminoso... opa, eu posso! Diria que foi um surto narcótico, uma loucura química. Na minha lógica o assassino pode ser usuário de craque, ainda que ninguém tenha dito isso ainda. Na minha lógica faria sentido.
As explicações não explicarão o assassinato nunca. O processo judicial que se seguirá também não. Ainda que as motivações sejam reveladas... Nada, nada. Ainda que a lógica explique em algum momento. Nada.

quarta-feira, 10 de março de 2010

A maior parte dos dias passo rindo, a outra parte chorando, mais ou menos isso.
Prefiro sorrir a chorar e prefiro chorar a nada.
Nada não existe e quase nada é a morte. Entristecer um pouco por dia até não perceber mais. Quase feliz e quase triste.
Meia vida é meia morte, queira ou não.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Leitura

Estava lendo um livro que foi incrível. É uma edição de 1978 de Os condenados do Oswald de Andrade. Esse livro foi comprado pelo Tomaz faz uns anos num sebo, mas nem ele nem eu tínhamos lido ainda. Só pra informar, a obra foi escrita entre 1919 e 1921 e grande parte se passa em São Paulo. À parte toda a beleza da obra e tal, ainda vem de brinde um retrato da São Paulo da época. As personagens circulam e moram pelo centro e alguns bairros da cidade e a própria cidade se torna uma personagem.
Além do prazer da leitura propriamente dita, tive o privilégio de ser a primeira pessoa a ler esse exemplar da obra. À medida que fui lendo o livro percebi que algumas páginas estavam grudadas, na verdade não haviam sido cortadas direito. Tive que desbravar as páginas, cortando com uma tesoura antes de ler. Quando me dei conta que tinham várias páginas grudadas e que ninguém tinha lido este livro inteiro fiquei emocionada por duas razões: por estar lendo um livro quase virgem e pelo fato de ninguém ter lido aquele exemplar do primeiro romance do Oswald. Ao longo dos seus 32 anos de existência, ninguém leu o livro que agora é nosso.
Fiquei muito feliz por finalmente tê-lo lido. Fiquei pensando em quantos livros estão por aí estéreis e me assustei, afinal já são tão poucos em circulação.
Enfim, dá pra explicar pra quem nunca sentiu, a emoção de amar um livro? Não uma obra, um romance, uma tese... um livro. O livro que é obra, é arte, mas é objeto. Objeto antigo, vivido, embolorado. Objeto que contém uma obra, contém um autor, uma pessoa, personagens, pessoas, cidades. Objeto cheio de vida e morte.

chove

a chuva cinza fazia a sax tocar, mas hoje não toca
lugar nenhum é lindo quando chove como aqui,
cidade molhada e enlameada
A lama que não nos deixa esquecer de onde estamos lama-merda-mijo
Os fedores humanos compartilhados na comunhão aguada de guarda-chuvas quebrados
quebrados e pequenos escondendo nossas cabeças alisadas
eriçadas
Garoa e ar molhado refrescam o rosto ardente dos sóis fluorescentes, descansam os olhos luzes leds sempre abertos.
Claro, cinza claro e frio outono em pleno verão.
Descanso.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

memória, britadeiras e relatório

Faz uma semana que a minha memória anda péssima. Se não bastasse não consigo pensar e falar ao mesmo tempo, perco o fio do discurso. Algo como se eu estivesse chapada o dia inteiro. Ontem tive que me esforçar pra conseguir fazer os comentários que gostaria no estágio do Tablado, fiquei anotando quase tudo que queria dizer. Será a tpm, esta maldita?

Outra possível explicação para meus problemas de memória é a filha da p#*@+$ da britadeira que tem me acordado às 8 da manhã desde o sábado de carnaval. É a sabesp trabalhando por mim, assim dizem os uniformes azuis. Duvido que eu tenha algum benefício no final dessa obra desgraçada de britadeiras e retroescavadeiras. Dá pra ser feliz com esse despertador? Obrigada sabesp.

Ah... meu relatório parcial da bolsa está praticamente pronto e, pasmem, um mês antes do prazo! Agora faltam alguns detalhes bobinhos, moleza. Espero que eu consiga fazer essa molezinha com minha atual falta de cérebro.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Felizes para sempre ou como eles se conheceram ou nóis capota mai num breca

A menina tinha uns 23 anos, loura de cabelos ora encaracolados, ora alisados. Chegou no seu traje algo anos 60 ou 70, mais pra 70. Combinou uma calça genérica com uma blusa estampada que lembrava passado, plataformas e um óculos emprestado em formato de coração vermelho. O figurino era obrigatório: anos 60 ou 70. Ela não estava nem uma coisa nem outra, mas enganava.
Veio de carona com um colega, tinha bebido uma caipirinha antes de sair de casa, enquanto se arrumava. No carro, falava um pouco mais alto que o necessário. Ela estava sempre um pouco além do necessário. Falava de como estava conhecendo a cidade, do trabalho, do cansaço e também do ritmo acelerado. O ritmo da cidade atiçava sua agressividade e ela falava mais rápido, gesticulava e batia nas pessoas, nas coisas. Ela se espalhava pelo carro, seus sons e risadas batiam nos vidros fechados. O amigo parou para comprar uma cerveja na loja de conveniência. Compraram e foram bebendo devagar até chegarem à festa.
Não sabiam o que iriam encontrar na festa, talvez fosse péssima... Entraram e encontraram outros amigos que os esperavam. Os amigos estavam sempre em grupos grandes demais para ela. Cumprimentou todos e foi logo perguntando do bar e se dirigindo pra lá ao mesmo tempo. Voltou com as bebidas e foi dando um jeito de acabar com a cerveja que estava quente. Bebeu rápido, mas era assim mesmo, bebia rápido demais. Olhava ao redor meio distraída, parece que as festas estavam sempre piores do que poderiam. Se irritava com o esforço de todos em ficarem no estado máximo de felicidade. Como se isso fosse possível naquele ambiente.
Um dos amigos tinha vindo especialmente por causa dela, tinham ficado juntos algumas vezes e agora a presença dele a irritava. Ele fingia que estava ali pra curtir a festa e repetia a frase: vamos curtir a festa! Ela se irritava com a cara falsa dele e aqueles olhinhos murchos pressentindo o fora. Vou pegar mais cerveja!
Bebia e tentava se concentrar na turba de amigos, não sabia mais do que falavam e não conseguia se interessar, era tudo tão confuso e chato. A conversa sempre se resumia às lembranças de festas que foram boas, casos bizarros em festas, bebedeiras, baixarias, etc. Um regurgitar e engolir aquele bolo festivo. Ela ria em alguns momentos, mas procurava com os olhos uma rota de fuga. Deu de cara com uns olhos grandes que sorriam para ela, um sorriso um pouco vulgar e gasto de tanto ser dado por aí. Mesmo assim aquele sorriso olhos e dentes pareceu diferente no escuro.
O sorriso aberto perguntava alguma coisa de longe, fez sinais. Ela pediu um isqueiro emprestado e foi em direção àqueles dentes, sorrindo também. Ele perguntou se ela fumava, enquanto acendia um baseado ordinário. Ela disse que sim e fumaram juntos, ele apresentou os amigos que estavam com ele. Já tinha encontrado com ele várias vezes, mas nunca o tinha achado tão lindo como naquela noite. Aliás, ele era um tipo irritante, sempre sorrindo e tentando conquistar quem passasse pela frente.
Eles dançavam juntos, fumando e bebendo, conversando aos berros algumas frases banais. Ela tinha ficado hipnotizada por ele que também usava uns óculos de fantasia. A fantasia dele era mais fajuta que a dela, uma camisa e calças pretas e uns óculos espelhados de camelô. Ela bebia e dançava com ele e alguns amigos dele que pairavam em torno. Não via mais os seus amigos e nem poderia voltar para lá. Já estava bêbada fazia um tempo, impossível de medir, sempre queria saber quando fora exatamente que tinha ficado bêbada. Quando foi o copo fatal?
Foi se deixando levar pela festa, pelo fumo, pelo moço sorridente. Ele era muito bonito, até demais! mas ao mesmo tempo a superficialidade daquela beleza prometia alguma coisa. Adivinhava alguma coisa embaixo daqueles músculos e daquele sorriso calculado. Por baixo de toda a casca de felicidade e beleza que revestiam o rapaz naquele dia e nos outros, tinha alguma coisa que ela não sabia o quê. Os amigos dela foram embora e ela ficou, sempre era a última a sair das festas. Tinha uma inércia que agia sobre o corpo dela que a impedia de ir embora.
Eles se beijavam e a música ensurdecia ambos, violentava o abraço dos dois obrigando-os a se mexer. Dançavam e se beijavam. Ele parecia bem mas ela estava bêbada, sabia disso. Pediu pra ir embora, o lugar estava quase vazio. Ele disse que a levava e perguntou sobre o caminho. Ela explicava que não conhecia a cidade direito, que tinha vindo de carona, foi dando referências. Saíram no carro dele e ela pensava como era arriscado ir embora com um cara que tinha acabado de conhecer. Ele era calmo no carro, diferente de tudo que ela tinha visto naquela noite. Ele quase não falava, só ficava ali perguntando umas coisas referentes ao caminho que ela não sabia responder. Os olhos tinham parado de sorrir e pareciam mais reais.
Ela pediu pra parar o carro, precisava vomitar. O carro encostou, ela abriu a porta, se encostou na lateral e vomitou. Vomitou muito e quando levantou a cabeça ele fazia xixi encostado no muro. Não sabe como chegaram na casa dela. Ela pensava que sempre aprontava dessas: vomitar com um cara que tinha acabado de conhecer. Sempre exagerava em tudo, falava alto, bebia demais, falava demais. Convidou ele pra subir. No elevador ela estava mole e ele ajudava a segurá-la. Entraram e ela apresentou o apartamento pequeno. Foi ao banheiro e instalou o bonitão na cama. Ele não dizia nada e parecia disposto a encarar o que viesse, estava tranquilo. Ela trocou a roupa por um pijama, disse pra ele que podia dormir ali e dormiu.
Quando ela acordou o bonitão tinha ido embora. Estava com uma bela ressaca, é claro. Pensava na noite anterior e lamentava o exagero. Lamentava que o bonitão tivesse ido, lamentava que tivesse bebido tanto, lamentava pela ressaca. Levantou e foi até a cozinha pra beber água. Viu do lado do telefone o nome e o número dele anotados com uma letra caprichada de homem.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

EUA atacam Brasil. Lula revida?

Numa manobra arriscada no contexto da política internacional EUA atacam o Brasil, o emergente mais queridinho do momento. Obama tem lançado celebridades pop sobre o Rio de Janeiro, elas vêm armadas até os dentes com suas minissaias, paetês, dietas de última geração, gemidos, perucas, grammys, etc. A questão é: porque o Rio? Sabemos que muitos gringos acreditam que o Rio é a capital do Brasil, mas é claro que Obama não é um deles. A sua estratégia é mais refinada do que se poderia pensar? Ou se trata simplesmente de vingança? A meu ver, a exemplo da guerra empreendida contra o terror, é uma questão de vingança. Michelle ainda não se conformou por ter perdido as olimpíadas de 2016.
Agora é urgente pensar no contra-ataque. Se Lula ainda não tem uma resposta à altura, eu sei o que fazer. Lancemos nossas celebridades baianas, nossas maternais cantoras de axé sobre Nova Iorque, elas vão fazer tremer o chão por lá. Mas só depois do carnaval, é claro!

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

os atores andaram no shopping e foram expulsos

Eram dois meninos e duas meninas que andavam. Andaram em diversas direções, em diversos ritmos. Relacionaram-se com o lugar espacialmente, topograficamente, gestualmente, cinestesicamente. Andavam. Olhando de longe pareciam estranhos, de perto apenas andavam. Aos que sabem ver pareceria normal, andavam de olhos abertos.
Na cidade, atores penduravam-se em prédios, escalavam o público institucionalmente.
Os meninos que andavam não estavam autorizados, sim, é necessário estar autorizado. Para andar e olhar no shopping em grupo (ainda que seja um pequeno grupo) é preciso autorização. Ainda que seja na rua, na calçada do shopping necessita-se autorização.
Sim, é necessário se institucionalizar, pedir autorização às instâncias superiores, ajoelhar-se e pedir: Senhor, posso andar pelas suas calçadas? Posso escalar seu prédio em troca de bilheteria e publicidade? Posso ser artista no seu espaço? Posso ser?

NÃO AUTORIZADO.
Por favor, encaminhe um e-mail para o depto de marketing com a descrição do evento e pedido de autorização.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

30

São estranhos 30, assim redondos, definitivos. Parece que explicam tudo, no entanto, se fossem 31 seriam menos estranhos. Parece que tudo está explicado assim: Flávia, 30 anos. Exatos.
Quase exatos. O tempo se mede em anos, dias ou horas e as horas são muito mais misteriosas que os anos. Quanto mais fragmento o tempo mais infinito ele fica. E os segundos então, os segundos! Tantos segundos passados, intensos e decisivos me confundem em relação a esse tempo tão exato. Afinal, como são os 30? Pra mim são um mistério, incontáveis minutos passados e imprevisíveis segundos futuros.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

gato por lebre

Saiu de casa com o roteiro definido: locadora, supermercado e banco. Era um início de tarde tranquilo, sem grandes compromissos ou possibilidade de estresse, afinal era tudo pertinho de casa.
Passou na locadora onde queriam cobrar o valor de lançamento sobre o filme que tinha alugado. O que lhe pareceu problema foi o fato de o filme ter sido realizado há uns quinze anos, inclusive ele já tinha assistido o filme em vhs. Ele tentou argumentar com o atendente – olha, eu não sabia que esse filme era lançamento, afinal o filme é velho. O rapaz estava preparado – mas esse filme é lançamento em dvd. Ele não entendia qual a lógica – amigo, que eu tenho a ver com o fato de você ter comprado o filme só agora? se lançaram em dvd ou blue ray ou a putaqueopariu? você devia pelo menos ter me avisado que se tratava de um “lançamento” - fez as aspas com as mãos apesar de odiar esse gesto. O rapaz da locadora continuava – mas o senhor não viu a etiqueta laranja? etiqueta laranja é lançamento. Ele olhou para a etiqueta laranja, uma bolinha laranja na verdade, colada na capa igualmente laranja do filme – ô meu filho, isso é piada? etiqueta laranja? pra começar onde está a legenda das etiquetas? - olhava ao redor e nas paredes e não havia legendas – sou obrigado a adivinhar o significado das bolinhas coloridas? O rapaz parecia determinado a irritá-lo, repetia as mesmas frases e parecia acreditar que assim explicava o mal-entendido. Saiu da locadora com uma certeza, cada dia mais vendia-se gato por lebre. Lançamento? Quando assistiu o filme pela primeira vez tinha uns quinze anos. Que idéia genial essa de transformar um filme antigo em lançamento, praticamente sem custo nenhum. Incrível que só ele pensasse assim.
A próxima parada, no supermercado parecia fácil, era só comprar ovos, tomates, alface e queijo. Foi direto às prateleiras certas, não gostava de ficar zanzando no mercado. Ele olhou para os tomates com desânimo, pareciam bonitos de longe, mas de perto dava pra perceber que a maioria tinha um pedaço podre ou um amassado e o cheiro nem de longe lembrava tomate de verdade. Escolheu como pôde e conseguiu selecionar quatro tomates. A alface estava toda amassada também, algumas folhas mais machucadas estavam pretas. Pegou um pé de alface que parecia quase intacto. Queijo fatiado e ovo pelo menos não tinha que escolher. Olhou as bandejas de ovos e lembrou-se que tinha tamanhos diferentes de ovos, médio, grande e extra. Escolheu o grande e foi em direção ao caixa. Nota paulista?
Foi ao banco pagar uma conta de luz, o caixa eletrônico prometia ser mais rápido que a fila dentro da agência. Enfiou o cartão e foi escolhendo: pagamentos – com códigos de barras – posicione o código para leitura – uma, duas, três vezes... nada. Mudou de caixa, evidentemente aquele estava com problema na leitura. Tentou novamente, o mesmo: uma, duas, três vezes e nada. O caixa eletrônico já não parecia tão atraente, a fila da agência talvez fosse uma opção. Mas não podia se conformar, a porra do caixa eletrônico não estava ali pra facilitar? e afinal ele pagava taxas além da mensalidade da conta que deveriam garantir algum conforto. Entrou intempestivo na agência a procura de alguém com quem pudesse reclamar, o gerente, por exemplo. Logo uma mocinha o alcançou – pois não senhor, posso ajudá-lo? Eu só quero pagar uma conta de luz. No caixa eletrônico?. Sim. Eu vou ajudar o senhor. Eu não preciso de ajuda, só quero que essa merda de caixa funcione. O senhor tentou aquele ali? Não querida, ainda não tentei todos. Ele tentou no caixa indicado que devia ser o único que funcionava direito e conseguiu finalmente pagar sua conta.
No caminho para casa pensava se era só ele que se incomodava com essas mentiras contemporâneas. Caixa eletrônico, pagamento com código de barras que não funcionava. Filmes velhos que de repente voltam a ser lançamentos. Lixo a venda no supermercado nas prateleiras de verduras. Como se acalmar? Como se acalmar e pagar? Porque a cobrança vinha sempre, no caixa, pelo correio, na maquininha do visa.
Entrou em casa, feliz por estar de certa forma salvo. Foi guardar as compras na geladeira. Os ovos grandes não eram tão grandes assim quando se abria a caixinha, pareciam mais ovos de garnisé. O engano continuava.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

dia primeiro

- Nunca vamos poder casar na igreja.
Ela estranhou um pouco a fala, mas nem tanto, já tinha ouvido piores.
- Porquê?
- Não temos nenhuma religião, nem acreditamos em deus. Não faz sentido a gente casar na igreja.
- É verdade. Tava pensando em casamento?
- Tava pensando em várias coisas, deus e tal... e percebi que não podemos casar na igreja.
Os fogos ainda explodiam e ela pensava em quantas vezes já tinha dito o que pensava sobre cerimônias de casamento. Achava um absurdo assinar qualquer tipo de documento, fazer qualquer tipo de juramento diante de juiz ou padre, convocar testemunhas, etc. Achava que o casamento só era possível como combinado entre os dois. Há alguns meses ela havia explicado tudo que pensava sobre o assunto. Tinha certeza de que havia falado tudo. Porque ele não ouviu? Talvez pensasse que era desculpa para evitar um compromisso maior. Maior? Como poderia se comprometer ainda mais? Achava que ele tinha começado com a história de casamento oficial para disfarçar todas as cagadas que tinham acontecido no casamento real deles. Como se até o momento tudo tivesse sido brincadeirinha. Mais uma razão pra ela não cair nessa cilada de casamento com padre e juiz. Não ia admitir essa saída. Lá estava ela no primeiro dia do ano pensando nas mesmas coisas...
- Você viu que essa árvore parece um gato?
Ele concordou, mas achava mais parecida com uma coruja.