quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

bolha x não

eu não vivo numa bolha
minha não-bolha é árida, esturricada
mas não é desértica, é cheia de figuras secas e espinhudas
muitas delas vivas, outras meio mortas
eu vivíssima querendo que as coisas me amem ou me odeiem

às vezes as coisas não querem sequer te odiar
na minha não-bolha as pessoas também me ignoram
nem percebem que estão lá
esse é meu maior pavor, os que ignoram a não-bolha e eu

eu toda agulha querendo explodir as bolhas alheias
por egoísmo mesmo, queria que todos sentissem e falassem
mas me ignoram e é a melhor maneira de preservarem seu mundo-bolha
dentro da não-bolha não se pode simplesmente esquecer

o meu lugar explodido
seco e habitado por seres e coisas
me proíbe de colorir o que é morto
me proíbe de ignorar o que é vivo

essas são as regras fundamentais da não-bolha
são duras e belas

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

o que não tem remédio

tudo morre, é certo. morre sim
se deixar quieto, morre. se agitar, morre
se espremer, morre bem rapidinho
se molhar demais, morre também

o jeito é deixar morrer, quando tá morrendo
ainda que os limites entre o ressuscitável e o morto suscitem dúvidas
uma vez morto, tá morrido
o jeito é deixar morrer em paz

chorar o morto e se jogar na cova
berrar e se agarrar ao corpo
cantar hinos e ladainhas
tudo pode e nada adianta

tudo morre, é certo. morre sim
se molhar demais, morre também

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

dia-a-dia

num dia tropeço
no outro levanto
num dia eu peço
no outro eu canto

num dia despeço
no outro eu tanto
num dia sucesso
no outro descanso

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

tum tum

eu tenho um coração
está confirmadíssimo
dia desses ele bateu todo errado

coração que não dispara não presta
é morto da silva
precisa de um susto

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

enquanto isso no reino de mariana

o sol nasce e esquenta a todos
todos se estendem em suas esteiras e cangas próprias
todos bebem e riem nas beiras dos mares e das piscinas
nas mesas os banquetes esperam pelos esfomeados
o sonho do proletariado é realizado

enquanto isso, mariana não se satisfaz
em seu reino não se espera que a comida brote nas mesas
não se estende simplesmente ao sol sem sombra de dúvida
a rainha mariana suspira ao contrário
e penso no que pensa

no reino de mariana sempre é tempo de imaginar
ainda que o estômago esteja cheio
ainda que o sol esteja quente
ainda que a água esteja ótima
ainda que a cerveja esteja gelada

nesse meio de tempo - o tempo é sempre um meio pra ela
ela constrói incontáveis histórias - histórias são construções, sim senhor
entre um momento e outro ela reserva um tempo pra construir
quem vê mariana imagina o que ela faz naquele lapso
é numa nesga de tempo que tudo se faz

e não ousem perturbar a rainha mariana no seu tempo
ela manda cortar nossas cabeças com um gesto
não que seja cruel, pelo contrário
apenas sabe que suas construções são obras sérias
suas obras são seu reinado

se a rainha mariana imaginasse o que seus súditos imaginam
se ela soubesse os comichões que nos provoca
talvez ela saiba, talvez
que imaginamos as suas histórias
que rabiscamos rascunhando aqui e ali

rascunhar é um delito bom de cometer
é feitiçaria e descobrimento
colhidos da despretensão dessa rainha louca, mas não é bem isso
não é possível desvendar o reino construído por mariana
não é bem isso, não