sexta-feira, 9 de setembro de 2011

mais um exercício dramático - hamlet

Talvez vocês não acreditem no que eu vou dizer agora. Eu vi o fantasma do meu pai ontem a noite. Ele se chamava Hamlet e era o rei. Engraçado é que eu fiquei pensando se na verdade o fantasma era eu. Não, eu sou um príncipe apenas. Eu sou o príncipe Hamlet, prazer.
O fantasma do meu pai me contou sobre o seu próprio assassinato e pediu vingança. Eu vingo, eu vingarei, meu pai. Engraçado que eu achei que o fantasma era eu, no escuro até que parecia. Pai, paizinho, é comum isso de os reis serem assassinados, são os ossos do ofício. O trono é uma coisa que só muda de dono com a morte, por isso os reis morrem.
Eu não, ainda não sou rei. Normalmente quem assume o trono é o assassino, não é assim? Normalmente o assassino é da família, não é? Papai, isso é tão comum entre os reis. Quer mesmo essa vingança? afinal o assassino é seu irmão e eu também posso morrer.
Eu mesmo duvido do que vi e ouvi, vingança? Parece absurdo e, num certo momento, eu realmente achei que o fantasma era eu.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

nada a fazer

a fonte seca
a palavra esvazia
o peito suspira uma última
o estômago se revira e na cabeça vêm tantas outras coisas
vem a conta de luz, o livro não lido
vem uma notícia trágica que revela um mal social
vem um aperto de mãos sincero
vem a incontável distância
(em algum momento a distância se tornou intransponível)
vêm as justificativas falsas e os farrapos
de um tecido que um dia teve cor

o leite secou
a saliva e o choro
estômago e olhos revirados são sintomas fatais de morte
lenta
len ta
len ta mente conquistada a duras penas
difíceis de arrancar da pele esturricada
do corpo machucado pelo deserto prolongado

não há mais nada a fazer doutor
o plano de saúde não cobre nem reembolsa
e a paciente não responde aos estímulos
nenhuma reação motora

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

patati patata patotia patata patati
blablabla ble ble ble bliblibli
putamerda porqueporque patati patata
nãopode não bla bla bla
buá buá buá buá buá não pode buáá

ahã, vamos mudar de assunto?

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

pesadelo de amor

por absoluta falta de tempo pra lidar com aquilo, colocou o bebê recém nascido em uma caixinha e guardou ali perto da cama. colocou fraldinha e alimentou o bebê como ele precisava. aconteceu que esqueceu ele ali durante muito tempo, pior que não sabia contar quanto. quando lembrou ficou com medo de olhar e ver o que tinha acontecido. mesmo assim abriu a tampa e viu que ele tinha crescido um pouco. a fralda estava encharcada e ele chorou. de repente lembrou como as crianças precisavam do contato com a mãe pra se desenvolver. ela tinha prejudicado seu bebê, mas era por falta de tempo. ela não queria ele agora, não tinha tempo. mesmo assim pegou ele no colo e viu que tinha um rabo comprido. ele se aninhou e ela se emocionou por ele estar vivo, se mexendo nos seus braços. acariciou o rabinho, as pernas finas e abraçou ele com amor. na verdade sentia amor por ele, com ele no seu colo pôde perceber o quanto. sentiu uma dor muito forte por ter deixado ele lá na caixa, não sabia porque tinha feito isso. achou que seria igual continuar no útero, como se dissesse: agora eu não posso cuidar de você, espera mais alguns meses aí na caixinha. mas o bebê não podia esperar, ele já estava vivo. apesar de tudo, o filho perdoou seu desleixo, mexeu o rabinho e ela viu que ele também amava.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

ofélia

era uma vez uma linda princesa que se chamava ofélia. na verdade ela ainda não era princesa, mas o príncipe era a fim dela. ela era jovem e recatada, enquanto o príncipe era estudado e ousado. a jovem ofélia tinha que se preservar, pois segundo o seu pai, o príncipe só queria comer a sua bacurinha. a futura princesa ofélia lembrava dos presentes e das mãos do esperto príncipe com alegria e corava. torcia as mãozinhas e olhava pra baixo quando o pai lhe perguntava. papai, o príncipe tem demonstrado seus sentimentos com muito respeito e faz juras de amor eterno. sei! dizia o pai da ofélia. filha, você não pode se entregar aos prazeres da carne. o príncipe pode tudo, porque é príncipe. você precisa se guardar e arrumar um marido que te sustente, porque eu não vou durar pra sempre. sim papai, eu sei, eu sei. vou apagar meu fogo e procurar um marido mais sossegado, do meu nível social. e ofélia continuava sonhando e querendo o príncipe, porque todas queriam o príncipe. ela tinha sido escolhida por ele, ele realmente levava presentes e gostava da pele branca dela. como recusar o príncipe? o príncipe podia tudo. era o que ela dizia quando ninguém estava por perto. posso colocar minha mão aqui, ofélia? você é meu príncipe e eu sou sua serva. um dia será meu rei, faça o que quiser por favor.
um belo dia o príncipe deixou de comparecer e ofélia murchou. talvez ele estivesse maluco, era o que se dizia. o príncipe não dizia mais coisa com coisa, mandou ela se casar com outro. pra piorar a situação, o príncipe matou o pai da ofélia sem querer. ele era um príncipe e podia tudo. ofélia ficou sem o pai, sem o príncipe e sem marido. aí começou a falar o que passava pela sua cabeça, usava as roupas que bem entendia e cantava. começaram a dizer que ela também estava louca, um surto de loucuras. ofélia não parecia mais tão pura e usava expressões vulgares. o príncipe podia tudo, a rainha podia tudo e o rei também. mas ofélia não era princesa ainda, ela cantava e colhia flores. passou a ser tolerada como uma débil e frágil moça perdida, uma espécie acidente. por fim, numa reviravolta trágica, a bela e jovem ofélia se afogou no lago. livrou-se de uma vez da culpa, do desejo, da saudade do príncipe e da piedade de todos. a suicida foi sepultada no cemitério mesmo, como se isso fizesse alguma diferença pra sua carne podre. o príncipe, dado a tragédias e paixões de modo geral, pirou com a morte da ofélia. saltou sobre o caixão da menina e duelou com o irmão dela ali mesmo. ele podia tudo.
ofélia só podia morrer ou ir pra um convento, mergulhar foi uma aventura.