sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

rosicleide

nas sextas-feiras que a cleide vem limpar nossa casa eu arrumo o quarto antes de abrir a porta. ela é muito organizada e fica visivelmente chateada com a desordem da escrivaninha. vira e mexe muda as coisas um pouco do lugar pra ver se melhora, ou se eu me animo de fazer isso. por ela ser faxineira fico pensando que a mania de limpeza e ordem é efeito colateral da profissão, pode ser.

eu tenho um vício de sorrir. anos de recepcionista acabaram com minha espontaneidade nos encontros, é claro que fiquei mais simpática, meu oi vem com sorrisão queira eu ou não. recepcionista professora atriz mulher professora atriz mulher sorriso sorriso sorriso sorrisão.

a cleide me contou que no sábado ela arruma o guarda-roupa todo e vai tacando água pela casa, limpando tudo. e a mãe fala - ih lá vem ela! e ela bota as mulheres da casa pra ajudar a limpar o quarto dos menores. ela não consegue ver nada sujo e bagunçado, já me dizia a sua irmã rose - ela é muito boa, tem até mania de limpeza. no fim do dia toma uma cervejinha lascada pra relaxar. hoje ela também me contou que quer tatuar outro unicórnio nas costas, que no meio tem os nomes dos pais e da filha e que o estúdio anda lotado esse mês.

o sorriso. às vezes quando abro a porta pra cleide de manhã eu não sorrio. por causa do horário, porque eu tava dormindo, porque ela acordou às 5 da manhã, porque o ônibus é lotado, porque teve enchente, porque não tem razão pra sorrir naquela hora. meu encontro com a cleide é espontâneo (e relâmpago porque eu volto pra cama). sou espontânea com a cleide de manhã quando ela chega. mas essa parte é muito importante: quando abro a porta não sou recepcionista atriz professora e mulher com a cleide.

mais tarde quando ela topa tomar um café comigo eu já estou sorrindo de novo e provavelmente sendo espontânea. às vezes fica difícil saber. ela me conta uns casos, me fala que a rose tá boa, eu conto umas coisas. a gente sorri junto pelo hábito, ou pela graça mesmo das nossas histórias. logo ela já vai levantando e retomando o foco na faxina e eu fico pensando que ela deve ter começado a faxinar muito novinha.

o mistério. a cleide sempre coloca o lençol de cima virado de cabeça pra baixo. ainda não quis perguntar qual a lógica dela porque gosto de pensar nesse mistério. não é falta de atenção, nem dúvida, ela tem certeza que o certo é pra baixo. eu tenho medo de perguntar porquê e acabar com esse suspense. com certeza ela tem uma razão pra colocar do lado errado. eu, apesar de querer muito saber qual é, não quero cortar esse fio de dúvida que me liga a ela desde que ela se vai até eu arrumar o lençol do meu jeito.

3 comentários:

Zíngara disse...

curti.

engenhoca do rube disse...

http://engenhocadorube.blogspot.com.br/2011/07/cultivo.html

engenhoca do rube disse...

http://engenhocadorube.blogspot.com.br/2011/07/cultivo.html